O seguinte artigo é do Público de dia 1 de Setembro. É interessante vermos não só o que se vai passar, mas como a imprensa tratará o debate.
Entre equipistas tudo isto já foi discutido. Pelo menos fica esclarecido que, ao contrário do que alguns gostam de pensar, este não é um debate encerrado. Venham daí as opiniões.
Especulações fervilham, irá o Papa rejeitar a teoria da evolução e aceitar o criacionismo?
Clara Barata
Bento XVI vai discutir a teoria da evolução e a religião com antigos alunos, hoje e amanhã, num debate que os cientistas seguem com toda a atenção.
O Papa Bento XVI junta hoje e amanhã alguns dos seus antigos estudantes de Teologia, para debater a evolução e a religião. Esta iniciativa está a ser encarada como o apoio por parte do Vaticano da posição de alguns grupos cristãos conservadores, sobretudo norte-americanos: a recusa da teoria da evolução através da selecção natural, formulada pelo naturalista britânico Charles Darwin no século XIX.
Já desde os anos 70 que Joseph Ratzinger convoca estas reuniões com os seus alunos, visto que antes de singrar na hierarquia do Vaticano foi professor de Teologia em quatro universidades alemãs, recorda a agência Reuters. Mas a polémica em torno da evolução nos Estados Unidos está a gerar um inusitado interesse pelo encontro deste ano, que se realiza na residência de Verão do Papa, em Castel Gandolfo.
Os blogues e sítios sobre ciência e religião estão cheios de discussões sobre se esta reunião significa que o Vaticano vai assumir uma postura mais crítica em relação à teoria da evolução, talvez até abraçando o criacionismo ou a teoria da concepção inteligente, nas suas roupagens mais modernas.
Sobretudo porque, na semana passada, o padre jesuíta e astrónomo George Coyne, que dirigia o Observatório do Vaticano há 28 anos, foi afastado do cargo e substituído por um outro jesuíta, José Funes, de 43 anos. Coyne tinha-se distinguido na crítica dos fundamentalistas que se recusam a aceitar como válida a teoria da evolução e não fez declarações depois de afastado.
O Papa João Paulo II não foi muito claro quanto à aceitação, ou não, da teoria que explica a história da vida na Terra através da evolução, que tem por motor os processos da selecção dos genes de indivíduos mais aptos e adaptados ao meio, que têm maior sucesso reprodutivo e assim passam as suas características genéticas à geração seguinte. Mas o anterior Papa procurou fazer as pazes com a ciência, neste campo e noutros - por exemplo, absolvendo Galileo Galilei no processo que lhe moveu a Inquisição, pela heresia de defender que a Terra gira em torno do Sol.
Foi em 1859 que Darwin publicou a teoria em que levou uma vida a reflectir, no livro Origem das Espécies. Seria de esperar que, quase 150 anos depois, a teoria da evolução fosse já um tema pacificado. Para os cientistas, sim. Para alguns líderes religiosos e para parte significativa do mundo, não.
Nos Estados Unidos, sucedem-se os casos de estados que tentam eliminar o ensino da teoria da evolução dos currículos escolares, ou pelo menos de a apresentar como uma teoria entre outras, não provada, e que é motivo de polémica entre os cientistas. O Kansas é um dos estados em que o tema é recorrente.
Com a entrada de George W. Bush (um cristão renascido) na presidência, estes movimentos que defendem uma interpretação literal da Bíblia, até da criação da Terra e da vida em apenas seis dias, ganharam novo fôlego, dizem os observadores do fenómeno cultural do criacionismo ou concepção inteligente. Nos EUA, parte considerável da população cristã, tanto católica como protestante, pode ser definida como fundamentalista, julgando essencial acreditar na literalidade da Bíblia - enquanto na Europa a maior parte dos cidadãos aceita que se trata de um texto alegórico ou metafórico, diz um artigo publicado este mês na revista Science, que compara a atitude das populações de 34 países face à evolução (ver gráfico). "Um em cada três adultos americanos rejeita firmemente o conceito de evolução, uma proporção significativamente maior do que na Europa ocidental", lê-se no artigo, assinado em primeiro lugar por Jon Miller, da Universidade do Michigan.
Toda a especulação em torno da jornada de reflexão promovida por Bento XVI pode não passar disso mesmo. Há que esperar para ver se o Vaticano se aproxima desta visão norte-americana.